Fui à padaria procurar o Prof. Viana para lhe falar de Kant. Não é que o professor de filosofia se dedique ao negócio da confecção de pão. Nada disso. A padaria transformou-se num espécie de café onde o professor costuma ir ler qualquer coisa, enquanto espera pela chegada do pão fresco do fim da tarde.
Logo que o vi disparei. Faz hoje duzentos anos que as arquitecturas neuronais de Immanuel Kant degradaram-se repentinamente para um estado de matéria caótica em putrefacção. O biótopo húmido que foi o notável cérebro de Kant deixou de fazer parte daquela única matéria que conhecemos no Universo que se reconhece a si mesmo e diz eu.
Viana sorriu e respondeu, - lá vem você com a sua teoria dos memes.
- É verdade. Disse-lhe. E de certo modo, Kant descobriu os memes, ou não foi ele que abriu a razão ao Mundo, afirmando que não há razão pura sem razão prática. Sim, mas não se esqueça dos filósofos gregos e de Abelardo, esse notável pré-escolástico teorizador dos universais, e não são os conceitos universais verdadeiras bases da genética mental das ideias e do pensamento. Claro, todo o pensamento é mémico desde o homo habilis ou antes mesmo. Por isso Kant, sem ter conhecimento da evolução e, menos ainda, da existência das espécies homo que povoaram durante mais de dois milhões de anos o nosso pequeno Planeta, inventou aquilo que designou por conceito limite, o intellectus archetypus.
E é extraordinário que um pensador tenha conseguido dizer, há mais de duzentos atrás, que aquilo é um conceito limite, que não limita apenas, mas que remete também para o que limita, acrescentando ainda que não é uma construção fantástica, antes uma analogia com o entendimento discursivo do homem, como sintetizou Heinemann em A Filosofia no Século XX. Kant morreu em Königsberg sem saber ao certo o que era o intelecto arquétipo, portanto, mais que os arquétipos definidos por Platão, ou seja, sinónimo de ideia, já muito próximos dos memes ou genes do genoma mental.
Kant conhecia, naturalmente, a definição dada pelos filósofos estóicos ao conceito de arquétipo como sendo a alma universal da qual resulta a alma individual e que encerram a consciência de Humanidade replicada para o indivíduo.
Para Kant, o intelecto arquétipo seria uma forma de entendimento divino ao qual o Homem não pode penetrar pois não lhe foi concedida uma intuição supra-sensível.
Tem razão, - diz-me o Viana, - mas eu confesso a minha ignorância, nunca tinha ouvido falar em memes antes de me falar deles.
- Sem os memes não estaríamos aqui a falar sobre Kan, - retorquit.
- É que antes dos memes, segundo a minha percepção da estrutura mental, havia já a função cálculo, sem a qual quase nenhum animal poderia sobreviver, procurar comida, saltar obstáculos, correr, apanhar presas ou procurar vegetais para comer.
Mas, a capacidade mémica vem do efeito de imitação que pode ter sido determinante para o processo de selecção que conduziu ao desenvolvimento do neo-córtex frontal. E o nosso intelecto arquétipo não é mais que o resultado da replicação do número extraordinário de unidades mémicas que construíram as nossas estruturas neuronais. Já Darwin argumentava que existe uma certa variação genética na habilidade que as pessoas têm em imitar. Da imitação do gesto anterior à Humanidade e que terá tido um ponto de viragem há uns 2,5 milhões de anos quando o homo habilis passou a talhar o sílex para fazer uma ferramenta de corte de animais e peles, o género homo passou à imitação da simbólica traduzida pela expressão oral, ou antes, a própria palavra é uma função mémica, remete para o princípio enquanto é já o limite final.
- Deve ser verdade isso, - respondeu o Prof.Viana. Por replicação imitativa deverá ter-se chegado ao Homo psychologicus no dizer de Nicholas Humphrey, portanto, os humanos capazes compreender que outros possuem mentes e auto-consciência de si mesmo, tornando-se também no ser duplicado como qualquer entidade existencial do tipo heidegeriano. Ser exterior e ser perceptível ou replicante, diria você. Mas, a teoria mémica, a meu ver, provocou a crise dos transcendentais kantianos, já que Kant não conseguiu explicar como conseguimos ter conceitos empíricos.
- A resposta é muito simplesmente por replicação mémica, - respondi, antes de tomar a bica e comer uma empada..
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