Domingo, 10 de Fevereiro de 2019
Conto da Palma da Mão - A Sorte de Adolf
Na trincheira em ziguezague alemã entre as destruídas aldeias de Grenilly e Ormes, quatro soldados de um regimento bávaro jogavam às cartas. Os canhões pareciam já cansados frente a Verdun, só esporadicamente caía uma granada. Os últimos cadáveres da manhã foram retirados e não chovia. O Hans tinha como parceiro o Adolf, enquanto o Christoff jogava com o Albert que dava o baralho.
De repente, o primeiro cabo Adolf levanta-se e diz: - tenho de ir defecar, a comida aqui deve estar quase podre. – Qual podre, responde-lhe o Albert, estás com medo e borras-te todo. – Não, diz-lhe o Adolf, posso ter o medo que todos têm em certos momentos, mas sou um entusiasta, estou a combater para a vitória do nosso Reich. – Está bem, que seja isso e não a nossa morte, acrescentou o segundo cabo Hans.
Adolf contornou mais uma esquina da trincheira e meteu-se numa reentrância tapada, onde despiu as calças e começou a largar para um buraco já bastante cheio.
De repente, ouve o silvo bem conhecido da granada de 75 mm seguido do violento estrépido dos explosivos e uns gritos de segundos e depois o silêncio. Adolf acabou a tarefa e limpou-se a um jornal da propaganda militar do Reich e saiu para ver o que se tinha passado. Os seus companheiros jaziam mortos, feitos em pedaços. Hans tinha meio corpo, o resto a partir das ancas tinha desaparecido. Albert ficou sem um braço e o ombro, deixando um enorme buraco vazio. Adolf olhou e pensou, “somos assim tão vazios por dentro”. Christoff já não tinha cabeça, mas ficou o crucifixo de latão agarrado ao peito cheio de sangue. Frio e sem emoção, Adolf disse para si mesmo, tive sorte, fui defecar mesmo no tempo certo. Não há dúvida que o futuro está à minha espera e alisou o seu pequeno bigode por debaixo do nariz